O ambiente digital não inventou a desinformação, mas ampliou a cobertura e a velocidade de circulação. Segundo dados do Relatório de Notícias Digitais de 2022, da Reuters, o consumo de notícias por mídias sociais é maior na América Latina e os entrevistados mostram preocupação com o que é real ou mentiroso. Além disso, a pesquisa aponta que 64% dos entrevistados brasileiros se informam por mídias sociais, entendendo como positivo a exposição de opiniões pessoais junto com a notícia.
Nesse contexto, os resultados das chamadas fake news são vistos tanto na vida privada, quanto pública. No primeiro caso, recorda-se o atual tema de telenovela em que a moradora do litoral de São Paulo foi vítima de linchamento, após notícias falsas divulgadas no Facebook a relacionarem ao sequestro de crianças para rituais de magia. Vinte anos antes, em 1994, donos da Escola Base foram acusados de abuso sexual a crianças, em uma série de erros de apuração de notícias, ainda dez anos antes da primeira rede social no país.
Na perspectiva pública, tanto a área da saúde, em tempos de pandemia, ou na imunização por vacinação; quanto a política, nas eleições ou publicidade de dados dos governos, são fortes exemplos. Lembra-se que, atualmente, existem estruturas para a produção da desinformação, geralmente inundadas por grandes recursos financeiros, assim como se vê os papeis dos discursos de lideranças, que possuem efeitos práticos, criando um ambiente de medo ou desorientação.
No limiar entre o público e o privado, está o caso recente de minimização do massacre na escola Sandy Hook, nos EUA. O radialista Alex Jones alegava que tudo não passava de uma tentativa do governo para reduzir o acesso às armas, prejudicando familiares de vítimas já sensibilizados após o ocorrido.
Esses fatos também suscitam a necessidade de combate à desinformação, compreendendo as características da digitalização da vida, em especial o rápido efeito nocivo e a capilaridade da rede. Propriedades que anulam o resultado de medidas tomadas dias depois, ou apenas em um local de divulgação. As mídias sociais incluíram avisos para assuntos sensíveis, indicando a busca de outras fontes de informação. Os veículos de comunicação adotaram táticas de exposição das notícias falsas em suas mídias sociais, assim como as agências de checagem têm dado suporte nas apurações. No entanto, avanço judicial importante parece finalmente englobar pontos decisivos desse cenário, pelo menos no âmbito eleitoral.
O TSE formou maioria para responsabilizar conteúdos inverídicos, implicando na remoção imediata após a notificação, incluindo os compartilhamentos em outros sites que não o da origem da medida, com a possibilidade de multa. Contudo, além de pensar respostas similares para fatos inverídicos em outras áreas que não a eleitoral, ainda é preciso refletir em respostas comunicacionais, que tenham efeito discursivo ao público que acessa ou compartilha esses conteúdos. Por enquanto, o que se tem nesse sentido é a tática da ridicularização pela ironia. Promissora igualmente pela alta circulação, mas que naturaliza a criação e a promoção de inverdades, além de depender intensamente do repertório do intérprete. O caminho para desestimular os usuários de mídias sociais a essa prática parece passar pela educação midiática, mas aponta desafios aos profissionais da área para respostas complementares que sejam tão simples quanto o compartilhamento de conteúdos falsos.
*Clóvis Teixeira Filho
Doutor em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo e coordenador de pós-graduação na área de Comunicação do Centro Universitário Internacional Uninter.